Foram tantas as aventuras que renderam bons quilos a mais… mais para mim e menos para o Mike, claro 🙂 Mas posso dizer que aproveitamos ao máximo, fazendo desta viagem a Portugal uma experiência cultural mas também enogastronômica. Com recomendações, causos e curiosidades para contar.

E PARA COMEÇAR, APERITIVOS

Quase em todos restaurantes portugueses, assim que sentamos à mesa, são colocados os aperitivos. No mínimo pão, manteiga e azeitonas. A atitude mais sensata, pelo menos na maioria das vezes, é recusá-los. Isto porque eles pesam – no estômago (já que os pratos individuais são geralmente muito fartos) – e no bolso também. N’O Fialho em Évora, por exemplo, só o pratinho de presunto cru (maravilhoso, diga-se de passagem) acrescentou 15 euros (!) na conta final. Abaixo, uma típica mesa farta de aperitivos.

PRATO PRINCIPAL

No interior do país há muitos, muitos mesmo, restaurantes que são tocados pelo marido (que serve as mesas) e pela esposa (que geralmente fica na cozinha). Em Lisboa, cidade grande, isto já muda. E é uma delícia ser recebido e servido pelo dono, que vai dizer quais são os pratos do dia e vai saber indicar um bom vinho. Basta dizer quanto você quer gastar e do que gosta e a indicação vem certeira. E eles fazem questão de saber, ao final da refeição, se realmente gostamos do prato servido.

A maior figura da viagem encontramos no restaurante A Maria (Rua João de Deus, 12, tel +351 268 431 143), em Alandroal, cidade próxima a Évora no Alentejo. Fomos tão bem recebidos e a comida era tão boa que voltamos lá no dia seguinte! Seu Cândido nos rendeu boas risadas. Primeiro nos disse que alguns clientes brasileiros lhe tinham dito que o restaurante dele era melhor do que um ‘famoso de São Paulo, um tal de Aquarius’ (não seria Antiquarius?!?), depois nos disse que estava feliz pois um descendente de portugueses estava ‘a disputar a Presidência do Brasil, o Manoel Serra’ (não seria José Serra?!?). No primeiro dia recusei a sobremesa e disse que não podia engordar. Na saída, ele me pegou pelo braço e olhou nos meus olhos bem sério e disse: ‘A senhora não está gorda, pare com isto!’ Eu quase acreditei 🙂 Sua esposa, a Maria, vinha à mesa ao final da refeição e contava como fazia os pratos. Que borrego (cordeiro) maravilhoso… No segundo dia ela me convenceu a comer sobremesa, me levou atrás do balcão e me fez colocar a mão no Bolo Rançoso para ver como ainda estava quente, recém-saído do forno 🙂 E não me arrependi, que bolo divino… Se estiver em Évora, vale muuuito a pena ir a Alandroal e comer no A Maria.

O borrego (cordeiro) em apresentação super tradicional e ‘rústica’ no restaurante A Maria em Alandroal…

… E o borrego (cordeiro) em uma apresentação super moderna do restaurante Alma, em Lisboa.

Também comemos muito bem no Alma, em Lisboa, que foi uma indicação do @bronza, ‘amigo tuiteiro’. Confesso que ficamos surpresos no início, pois o Alma não tinha aquele ambiente ‘legítimo português’ – sendo o tipo de restaurante que, depois que você entra, poderia estar em Lisboa, Nova York ou São Paulo (atentem para a luminária – que fica girando e parece uma nuvem de verdade). Mas a cozinha do conceituado chef português Henrique Sá Pessoa é uma interpretação moderna da tradicional cozinha portuguesa. Há vários menus-degustação legais, mas quisemos escolher os pratos um a um. Além do borrego ‘moderníssimo’ da foto acima, comemos entradinhas deliciosas e um bom polvo; e uma das sobremesas da noite entrou na lista das melhores da viagem, o arroz doce perfumado com baunilha, creme de pera e raspas de chocolate negro. O vinho Alento, que tomamos no Alma, foi uma das grandes (e boas) ‘enosurpresas’ da viagem.

O outro restaurante digno de nota da viagem foi O Alcaide, na cidade de Óbidos. Também um restaurante familiar, o dono entendia muitíssimo de vinhos e tinha uma carta de vinhos enorme, que além dos rótulos vinha recheada de poemas e ditados sobre a bebida 🙂 A indicação do vinho, safra de 2003, foi a dedo e agradou muito. Aqui comemos o melhor prato da viagem, um fantástico polvo a lagareiro. O bacalhau recheado com queijo da Serra e acompanhado de maçãs e castanhas assadas estava divino também. O único senão do lugar foi a falta de boas sobremesas portuguesas.

PAUSA PARA UM CAFÉ

A MELHOR hora do dia. Os portugueses páram (e nós também parávamos) para o café com um docinho à tarde. O café quase sempre é excelente, bem tirado e ‘farto’, e não é tão caro como em outros países da Europa (cortava o coração tomar um espresso na Itália, às vezes ‘um dedo’ de café por 4 euros!). Bons segredos para aproveitar os melhores doces: primeiro, pastelaria cheia – onde há rotatividade e os doces são mais fresquinhos (e não dá para fazer como em Ribeirão Preto, onde a atendente da padaria avisa que aquele doce é do dia anterior…) e segundo, escolher o doce mais típico do lugar – geralmente mais fresco ainda.

A Pastelaria Conventual Pão de Rala (R Cicioso 47, tel. +351 266 707 778) em Évora foi uma das primeiras doces surpresas. Lugar bem escondidinho e fora de mão, mas uma jóia. O doce típico da região, o Pão de Rala (pão recheado com amêndoas e doce de gila, espécie de abóbora) e o Mel e Nozes (bolo de panquecas recheado de creme de ovos com mel e nozes) tinham acabado de sair do forno e estavam divinos.

Fiquei pensando neste nome tão diferente, ‘pão de rala’, que não tem a ver com nenhum dos ingredientes envolvidos na sua receita. E me veio à cabeça que talvez este nome possa ter origem no pão challah, considerando que o Alentejo abrigou uma grande população judaica, ali instalada desde o período da ocupação muçulmana. Quem sabe meus ‘amigos tuiteiros’ professores de gastronomia @aureateodoro, @BergamoM e @Gourmandise ou as amigas portuguesas do Facebook – Ameixa, Alcina e Helena – possam trazer uma luz ao tema 🙂

Os travesseiros de Sintra e os pastéis de Cruz Alta, junto com os pastéis e as queijadinhas de Sintra, também ficaram entre os melhores doces, na divina pastelaria Café A Piriquita (Rua das Padarias, 1, tel. + 351 219 230 626) em Sintra.

Last but not least, os melhores pastéis de nata de Portugal, na pastelaria Pastéis de Belém, ao lado do Mosteiro dos Jerônimos em Lisboa. Estes pastéis agradam tanto os ‘locais’ como os turistas e são bem famosos, pelo que o lugar está sempre muito cheio. A melhor hora é pela manhã, bem cedo, quando os turistas ainda não chegaram e os ‘locais’ estão tomando seu primeiro café com pastel de nata do dia. Depois, mais tarde, tem que ter paciência para enfrentar fila e empurra-empurra. Mas compensa, e muito. Estávamos ‘trucando’ que aquele pastel de nata seria melhor do que outros que comemos. Pois ele é! Fresquíssimo, massa folhada fininha e crocante, recheio quente e saboroso, doce na medida certa. Vale a pena.

E o ranking completo da viagem a Portugal…

Melhores restaurantes:
A Maria, em Alandroal
O Alcaide, em Óbidos
Alma, em Lisboa

Melhores pratos:
Borrego assado com batatas d’A Maria
Polvo a Lagareiro d’O Alcaide
Leitão assado a moda de Covões no Martinho da Arcada de Lisboa

Melhores sobremesas:
Manjar das Chagas do restaurante da Pousada D. João IV em Vila Viçosa
Bolo Rançoso d’A Maria em Alandroal
Arroz doce perfumado com baunilha, creme de pera e raspas de chocolate negro do Alma em Lisboa

Melhores doces:
Pastel de Nata do Pastéis de Belém em Lisboa
Pão de Rala da Pastelaria Conventual Pão de Rala em Évora
Travesseiros de Sintra d’A Periquita em Sintra

Melhores vinhos tintos:
Cartuxa Reserva 2006
Pera Manca 2005
Alento Luis Louro 2006
Quinta dos Roques Reserva 2007
Quinta do Portal 2003

Melhores vinhos brancos:
Pera Manca 2007
Esporão Private Selection 2008
Fournier Père & Fils Sancerre 2007

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22 Comentários
  1. Olá Luciana
    Pois é a nossa gastronomia é muito rica e variada e os doces de que falou são a minha perdição, na maioria doces conventuais, carregadinhos de gemas.
    Quanto ao pão de rala existe uma lenda que diz "..que durante o seu curto reinado, visitou Évora o jovem rei D.Sebastião, tendo-se acolhido às freiras Xabreganas do Convento de Santa Maria do Calvário. À chegada do régio senhor, cansado das durezas da viagem e do calor que fazia, um valido real encarregado do protocolo, lembrou a Madre Abadessa da necessidade de oferecer um refrigério ao real hóspede.
    A monja, que há muito esperava em vão a ajuda do Paço para a sobrevivência do pobre convento, retorquiu que só havia uns "pães ralos", azeitonas e água; era o que havia e foi o que veio. O monarca comeu e apreciou.
    De volta a Lisboa, despachou uma tença compensadora em benefício do convento e em agradecimento, a criatividade monástica retribuiu com esta doce alegoria conhecida por Pão de Rala, que fez as delícias do rei e também de todos nós"
    Pois tem que voltar para conhecer as delicias do norte 🙂
    bjs

  2. Olá Luciana,
    conheci seu blog há menos de uma semana, ams foi amor a primeira vista..
    Vivencio uma história muito semelhante a sua..Eu e o marido nos mudamos para Berkeley, Califórnia em abril deste ano e os planos é ficar por aqui cerca de 3/4 anos…
    Me sensibilizo e alegro lendo seus posts!
    Ah, recentemente também fiz um blog..Qd der faça uma visitinha
    bjs,
    http://www.blogsweet-home.blogspot.com

  3. Alcina, obrigada pela explicação! Entre os melhores doces da viagem estava o Manjar das Chagas, feito com carne de coelho. Não achei esta receita em parte alguma, se você tiver uma receita deste prato, te agradeço. Bjs,

  4. Olá Luciana
    Vinha contar o que sei do pão de rala, mas a Alcina foi rápida.
    Dos restaurantes mencionados, não conheço o do Alandroal, tenho de fazer uma visita….
    Que bom ter gostado da nossa gastronomia e vinhos!

  5. Lú querida!

    Que post sensacional! Texto e fotos de dar água na boca!

    Fiquei curiosa pra saber como era o creme de pêra que acompanhava o Arroz doce, gostaria de tentar replicar a receita.

    Sobre o Manjar de Chagas, fui correndo buscar meu livro de doçaria conventual mas cadê que eu achei o tal doce? Tem manjar celeste, manjar real e manjar de língua. Mas nada de Chagas…

    Como vc disse que era feito com coelho, não pude deixar de lembrar do Blanc Mange, sobremesa tradicional inglesa semelhante a uma bavaroise, mas que na sua origem, na Idade Média, era feito com leite, amêndoas e carne de frango. Atualmente só se encontra a versão orginal na Turquia. Dá uma olhada aqui pra ver se tem alguma coisa a ver: http://en.wikipedia.org/wiki/Blancmange

    Bjs e parabéns pelo post!

  6. Oi Lú, cheguei aqui por acaso. Não sabia nem que vc tinha um blog! Já virei fã! Beijos, Monica Zarth

  7. Oi Ana, obrigada :-))
    Demorei pra responder pois fui lá xeretar o Blanc Mange. É bem diferente do Manjar das Chagas, que é um doce de comer com colher, tem uma coloração marrom-acinzentada e consistência e aparência de doce tipo bananada, marmelada… Eu me esqueci de tirar foto dele!! Vou ter que apelar para as portuguesas de novo 🙂 O creme de pera era mais um purê de pera mesmo, e conbinava super bem com o arroz doce e as raspas de chocolate.
    Um beijo,
    Lu

  8. Que maravilha de comidinhas, então a "cara" desse polvo matou-me, e aqui mesmo "à mão de semear"…

    Realmente o presunto nos restaurantes é super caro, muitas vezes mais caro que o próprio prato.
    Adorei saber desse restaurante no Alandroal, espero conseguir conhecê-lo no próximo verão, costumo passar férias no Alentejo.
    Não é à toa que a gastronomia portuguesa é famosa… 🙂

  9. Olá Lu, voltei 🙂
    Quanto ao fermento ramazzotti que usei no pão de chouriço não errou muito, o pacotinho tem 11gr.
    Desse manjar de chagas a unica coisa que consegui ver para já é que é feito á base de ovos(gemas)amendoa e raspas de coelho assado, mas posso tentar saber mais 🙂
    Cá em portugal há uns doces conventuais meio esquisitos, aqui na zona de coimbra(montemor-o-velho) há um que leva sangue, nunca tive coragem de provar, há um que leva vinagre e há um pudim muito famoso que leva toucinho(carne gorda de porco) por isso se tiver coragem é só voltar para conferir como voces dizem 🙂
    bjs

  10. Oi Lu,
    este post está de dar inveja ao Edu, hehehe.
    Eu tambem fiquei com um pouco de boa inveja desta sua maravilhosa apresentação.
    Beijo grande

  11. Que bom que gostou da nossa comidinha, espero que volte para provar a de cá do Norte, sou suspeita mas posso dizer que é uma maravilha. bj

  12. Lu, fiquei babando com as fotos e comentários! Somos descendentes de portugueses (e quem não é?) e a relação com a comida esteve sempre muito presente em casa. Meus pais já viajaram algumas vezes para Portugal e também têm os locais favoritos, mas eu somente estive uma noite em Lisboa e não vi nada…conexão de vôos…
    Quero muito voltar e conhecer mais o interior do país, conhecer essas figuras como o do post e as delícias da mesa!
    Um beijo grande!

  13. Boa tarde Lu, conheci seu blog através do blog da Nana, adorei de cara, estarei te acompanhando, quando tiver um tempinho faça uma visitinha no meu! Bjinhos

  14. Esse queijo de massa mole que aparece na primeira foto é Queijo de Azeitão?
    Aliás, por falar em foto, o ponto do cordeiro que vocês comeram no Alma estava exatamente como gosto. Você bem que poderia ter trazido uma quentinha pra mim. 🙂
    Excelente post, Luciana. Obrigado pela menção. Deu muita vontade de voltar a Portugal.
    Abraços!

  15. Que delícia de post, Lu! Portugal é tudo de bom, não é mesmo? Até hoje eu sonho com esses inigualáveis pastéis de Belém… ;o)
    Beijos!

  16. Ai que delícia tudo isso, Lu!

    Lembrou da minha viagem.

    bj
    Alessander

  17. The pictures look amazing! I wish I would avlar castellano. 🙁

  18. Luciana,
    Como é o manjar de Chagas? Eu sei que leva carne de coelho mas o aspecto?
    Minha avó fazia chouriça que era o sangue feito
    doce carregado nas especiarias.
    Na culinária rural italiana há um prato feito com carne de novilho/vitelo feito almôndegas doces- Dolce e brusco.
    Abraços.

  19. Oi Jane, o manjar das chagas é um doce para se comer de colher, de tom caramelo escuro. Muito bom viu?

  20. Portugal é sem dúvida alguma um país gastronómico em que se come muitíssimo bem!

  21. Oi Luciana, que delícia ler seu blog… adorei as dicas de bons restaurantes em Portugal. E as fotos então? Quando fui a primeira vez à Portugal, só fiquei por Lisboa, e me ainda me lembro como os pratos eram bem servidos! Estou organizando uma “volta às origens”, vamos para conhecer a família do meu avô, que veio de Portugal para o Brasil quando moço, mas os irmãos vivem na mesma cidadezinha. Não podia faltar um giro por Portugal para conhecer a cultura e a gastronomia.
    Gostaria de te fazer uma pergunta, talvez indiscreta: você se lembra do preço desse bacalhau recheado com queijo da Serra, do restaurante O Alcaide em Óbidos? Foi o prato que mais fiquei com vontade de comer, mas pareceu ser um pouco caro, porque o queijo da Serra da estrela custa os olhos da cara aqui no Brasil. Ah, você sabe se eles abrem para o almoço? Talvez você não se lembre, se for assim não tem problema. Não vou deixar de dar uma olhadinha no cardápio quando for para Óbidos! Muito obrigado pelas dicas e vou ficar acompanhando o blog. Abraços.

    • Oi Gustavo, obrigada! Um giro por Portugal tem que incluir mesmo cultura e gastronomia 🙂 Nnao lembro do preço deste bacalhau especificamente, mas o restaurante não era luxuoso, era razoável. Eles abrem para o almoço, sim. Passe lá porque vale a pena. Abraços e boa viagem! Luciana

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